terça-feira, novembro 16, 2021

História e Cultura - “História, arquivos e mulheres: perspectivas interdisciplinares” - Até 10/02/2022

Nome da Revista: História e Cultura

Classificação: B2

Dossiê Temático: “História, arquivos e mulheres: perspectivas interdisciplinares”

Prazo: 10/02/2022

Titulação: autoria de pós-graduandos stricto sensu (mestrandos e doutorandos), mestres e doutores

Link para a chamada: clique aqui 


Texto da chamada


Chamada para o Dossiê nº 1 (Vol. 11, 2022)


Prezados autores, 


A revista História e Cultura, em conjunto com os organizadores Profa. Dra. Marina Mazze Cerchiaro (Pós-doutoranda pelo Museu de Arte Contemporânea da USP) e Profa. Ma. Carolina Alves (Doutoranda em Ciências Sociais Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro), convida todos os membros da comunidade acadêmica a enviarem suas contribuições para o dossiê “História, arquivos e mulheres: perspectivas interdisciplinares”


Os textos devem seguir nossas Diretrizes para Autores e devem ser encaminhados pelo sistema da revista até 10/02/2022.


Atenciosamente,


Organizadores e revista História e Cultura


Resumo da proposta:


Desde a década de 1970, historiadoras vêm apontando a ausência das mulheres nas narrativas da história tradicional. Como lembra Michelle Perrot, em seu hoje clássico texto "Práticas da Memória feminina”, “no teatro da memória as mulheres são sombras tênues"[i]. As razões para isso estavam no fato da história privilegiar o espaço público, a política e a guerra, lugares sociais que foram durante muito tempo pouco acessíveis às mulheres, mas também à ausência de fontes, o que Perrot denominou de “o silêncio dos arquivos”. A ausência das mulheres nas narrativas da história, contrapunha-se com o seu papel como guardiãs da memória. Se, como defendeu Perrot, “a memória feminina é verbo”, as fontes primeiras de uma história das mulheres que começou a ser escrita nas décadas de 1970 e 1980 foram os relatos orais, os diários e autobiografias.


            Atualmente, como demonstra Joana Maria Pedro[ii], é possível traçar uma historiografia da “história das mulheres” – de vocação interdisciplinar – e mapear um vocabulário específico que foi construído ao longo do tempo pelo uso de categorias como “mulher”, “mulheres”, “gênero” e “feminismo”, impactado mais recentemente por reflexões decoloniais. A proliferação desse campo de estudo a partir dos anos 2000 e a importância não só acadêmica, mas também política e cultural que ele adquiriu é patente e fica visível nos muitos artigos, publicações e eventos acadêmicos dedicados à área. A própria revista História e Cultura lançou dois dossiês sobre “História e Gênero”, em 2018 e 2019.


            Se as narrativas históricas que estão emergindo sobre as mulheres, suas construções de identidades e representações, são muitas e diversas, são raros os debates sistemáticos e abrangentes sobre o lugar das mulheres e os impactos das reflexões de gênero nas instituições de salvaguarda da memória, em particular no campo dos arquivos[iii]. Nos últimos anos, estudos vêm indicando e problematizando a escassez de documentos sobre mulheres nos arquivos brasileiros, o que corrobora para a manutenção do apagamento de sua atuação. Essa ausência é fruto de processos sociais que não reconheciam as mulheres como sujeitos históricos e das múltiplas imposições que frequentemente preteriram a atuação feminina ao ambiente doméstico[iv]. Falar de arquivos de mulheres é reconhecer que muitas vezes esses documentos, se encontram dispersos e fragmentados em diferentes instituições ou mesmo relegados à esfera dos arquivos familiares, restritos à consulta pública. 


            Os arquivos históricos são lugares privilegiados de produção de conhecimento, acessados por pesquisadores de diversas áreas e que por meio de suas leituras sobre o passado ajudam a consolidar o que será lembrado. Ao guardar experiências de pessoas, grupos e instituições, os arquivos são espaços legitimadores, produtores e difusores de determinadas memórias. Pensar nas lógicas de exclusão como conformadoras de acervos históricos é compreender que eles se constituem em um contexto de silenciamento derivado de um projeto político mais amplo. Assim como a história tradicional privilegiou em suas narrativas grupos e pessoas específicos, os acervos também o fazem em relação à salvaguarda documental. 


            Para discutir sobre esses apagamentos, visibilizar os conjuntos documentais de e sobre mulheres (incluindo coletivos, movimentos e associações feministas ou femininas) e pensar os impactos dos estudos de gênero e do feminismo na prática da arquivologia, foi criada, em novembro de 2020, a Rede de Arquivos de Mulheres (RAM). Ela reúne instituições de salvaguarda e seus funcionários e pesquisadores interessados em refletir sobre as diversidades de gênero associadas às assimetrias étnico-raciais e regionais em arquivos. Visa ser um espaço coletivo e colaborativo de troca de conhecimento e de formação e busca fomentar a realização de eventos e publicações, além de difundir informações sobre o tema. A RAM tem também instigado as instituições arquivísticas que a integram a realizar um mapeamento das mulheres presentes em seus acervos e a repensar metodologias de organização e processamento de arquivos com atenção especial para os instrumentos de descrição e atividades de indexação e classificação, que podem corroborar com o apagamento ou contrapor-se a ele, garantindo maior visibilidade para as mulheres e para os documentos produzidos por elas. 


            Em consonância com os objetivos da RAM propomos o dossiê História, arquivos e mulheres: perspectivas interdisciplinares que tem como objetivo reunir artigos de pesquisadores de diferentes áreas das ciências humanas, de várias partes do Brasil e também do exterior, que reflitam sobre as relações entre o fazer historiográfico e as práticas arquivísticas sob perspectivas de gênero. Serão bem-vindos, textos que tratem da história de mulheres, movimentos, coletivos e associações femininas ou feministas com base em fontes arquivísticas, tanto de arquivos públicos quanto privados. Incentiva-se a proposição de artigos sobre mulheres atuantes em diferentes áreas (ciência, política, economia, cultura, artes etc..), mas também sobre mulheres anônimas, negras, lésbicas, indígenas entre outros grupos frequentemente excluídos das instituições de memória. O dossiê pretende acolher também textos que tratem sobre o processamento de arquivos de mulheres, visibilizando novas fontes para pesquisas históricas.      


            As teorias feministas e estudos pós-coloniais[v] têm introduzido novas reflexões e suscitado debates éticos a respeito do papel dos acervos salvaguardados por instituições patrimoniais de memória, tais como bibliotecas, arquivos, centros de memória ou museus. Com base nessas abordagens, esta proposta de dossiê também reunirá artigos que: 


a) problematizem as ausências de mulheres nos arquivos e reflitam sobre as marcas do machismo, misoginia, branquitude e colonialidade nos acervos, nas práticas institucionais, nas políticas de salvaguarda e/ou no acesso ao patrimônio documental, identificando as relações de poder impregnadas. 

b) analisem e/ou repensem práticas e formas de “guardar, ordenar, reunir, institucionalizar o que ninguém vê, o que poucos guardam e valorizam”[vi] e que tragam reflexões sobre a democratização da memória. Nesse sentido, interessam em particular, artigos que, pensando o campo dos arquivos, reflitam sobre os impactos de matrizes de pensamento que entendem a masculinidade e a branquitude como hegemônicas e busquem analisar estratégias de inclusão de mulheres nos acervos e/ou nos ambientes de trabalho, de pesquisa e na bibliografia dos cursos voltados para essa área. 

 


[i] PERROT, Michelle. Práticas da Memória Feminina In: Revista Brasileira de História, V. 9, n 18, p.9, 1989.


[ii] PEDRO, Joana Maria. Relações de gênero como categoria transversal na historiografia contemporânea. Topoi (Rio de Janeiro) , v. 12, n. 22, pp. 270-283, 2011. Acessado 19 Junho 2021. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/2237-101X012022015>. ISSN 2237-101X. https://doi.org/10.1590/2237-101X012022015.


[iii] Até o momento, conhecemos apenas dois dossiês sobre o assunto publicados em revistas acadêmicas brasileiras: SIMIONI, Ana Paula e ELEUTERIO, Maria de Lourdes “ Mulheres, Arquivos e Memórias”, Revista Do Instituto De Estudos Brasileiros, (71), 2018. Disponível online: https://www.revistas.usp.br/rieb/issue/view/10898/1516 e “As várias faces dos feminismos: memória, história, acervos”. ACERVO- Revista do Arquivo Nacional, v. 33 No 2, n. 2, p. 21-25, 2020. Disponível online: http://revista.arquivonacional.gov.br/index.php/revistaacervo/issue/view/81.


[iv] Um exemplo são os poucos arquivos de mulheres declarados de interesse público e social pelo CONARQ.


[v] Ainda é restrita a literatura que associa acervos e teoria decolonial. Sendo assim, tem sido fundamental a aproximação de estudos no campo das ciências humanas como QUIJANO, A. (2005 e 2009); KILOMBA, G. (2019); DAVIS, A. (2016); FANON, F. (2008); GONZALEZ, L. (1984 e 2018); NASCIMENTO, A. (2016); e outros.


[vi] Vassallo, J. (2018). Mujeres y patrimonio cultural: el desafío de preservar lo que se invisibiliza. Revista Do Instituto De Estudos Brasileiros, (71), 80-94. https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i71 p. 92. (Tradução nossa)